O ex-governador do Espírito Santo Paulo Hartung analisa quais são os saberes necessários à educação do presente em novo artigo escrito a pedido do Jornal On Line Folha Vitória. Confira o texto na íntegra:
O título deste artigo se inspira no clássico texto do pensador francês Edgar Morin “Os setes saberes necessários à educação do futuro”. No último artigo que publiquei neste portal, com repercussões nas redes sociais, discuti a relação entre educação e democracia, a partir do sétimo saber apontado por Morin: “A ética do gênero humano”.
Conforme salientei, a publicação foi produzida sob encomenda da Unesco e editada em 1999, mostrando que o futuro a que se referia Morin é exatamente o nosso presente. Daí, a adaptação do título do livro para o título deste artigo, em que faço um breve relato sobre os outros seis saberes importantes a uma prática educacional que dê suporte ao avanço civilizatório neste terceiro milênio. No entanto, antes de seguir apresentando a pauta indicada por Morin, reitero o convite feito à leitura do livro.
1 – “As cegueiras do conhecimento: o erro e a ilusão” – A educação deve esclarecer quanto ao complexo processo de constituição do conhecimento em nossas sociedades, permanentemente sujeito ao risco de equívocos, distorções e manipulações. “Trata-se de armar cada mente no combate vital rumo à lucidez.”
2 – “Os princípios do conhecimento pertinente” – É necessário educar para a contextualização, a realização de links e conexões entre o que é local ou parcial ao contexto e ao global. “É preciso ensinar os métodos que permitam estabelecer as relações mútuas e as influências recíprocas entre as partes e o todo em um mundo complexo”.
3 – “Ensinar a condição humana” – “O ser humano é a um só tempo físico, biológico, psíquico, cultural, social, histórico. Esta unidade complexa da natureza humana é totalmente desintegrada na educação por meio das disciplinas”. Assim, a educação deve investir na conscientização das múltiplas determinantes que nos constituem, evidenciando “o elo indissolúvel entre a unidade e a diversidade de tudo o que é humano”, fazendo-o de modo articulado e integrado entre as diversas disciplinas.
4 – “Ensinar a identidade terrena” – “Convém ensinar a história da era planetária, que se inicia com o estabelecimento da comunicação entre todos os continentes no século XVI, e mostrar como todas as partes do mundo se tornaram solidárias, sem, contudo, ocultar as opressões e a dominação que devastaram a humanidade e que ainda não desapareceram”.
Aqui, um comentário meu: a crise financeira, que repercute mundo afora, é mostra dessa contingência de vida globalizada a que chegamos e que precisa ser pensada e discutida, como bem aponta Morin.
5 – “Enfrentar as incertezas.” O autor diz que as ciências permitiram a formulação de muitas certezas, mas que o século XX levou à revelação de inúmeras incertezas. Assim, “seria preciso ensinar princípios de estratégia que permitiriam enfrentar os imprevistos, o inesperado e a incerteza, e modificar o seu desenvolvimento, em virtude das informações adquiridas ao longo do tempo. É preciso aprender a navegar em um oceano de incertezas em meio a arquipélagos de certeza. [...] A fórmula do poeta grego Eurípedes, que data de vinte e cinco séculos, nunca foi tão atual: ‘O esperado não se cumpre, e ao inesperado um deus abre caminho’”.
6 – “Ensinar a compreensão” – Morin destaca que a compreensão é uma vocação da comunicação humana, mas que “a educação para a compreensão está ausente do ensino”. “O planeta necessita, em todos os sentidos, de compreensão mútua”. Além de a educação formar para a compreensão entre “próximos” e “estranhos”, o autor defende que ela se dedique ao exame das raízes da incompreensão (“racismo, xenofobia, desprezo”), enfim, de preconceitos e egoísmos tão presentes na atualidade. Assim, se constituiria “uma das bases mais seguras para a educação para a paz”.
Conforme salientei, completa esse conjunto de saberes a “ética do gênero humano”, abordada em meu artigo anterior, que sustentaria a vida democrática e cidadã, seja como indivíduos, seja como comunidade (cidade, estado, nação, planeta).
Como venho relatando nesta série de artigos em defesa do investimento em educação de qualidade, não há alternativa à construção e ao avanço da civilização que passe ao largo do processo educacional.
Em todos os âmbitos de nossa existência (individual ou coletivo), tanto nos aspectos político-econômicos quanto nas questões socioculturais, a educação tem um papel fundamental no projeto civilizatório, sempre desafiante, mas sempre impositivo, se queremos vida digna para todos. Nessa direção, Edgar Morin oferece um crucial mapa de caminhada para o terceiro milênio e suas questões.
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